A
Desencarnação
A morte do corpo físico é fenômeno
natural que atinge todos os seres da Criação, cedo ou tarde. A
desencarnação acontece quando os laços peripirituais, até então mantidos
enraizados, molécula a molécula no corpo físico, se desfazem, concedendo liberdade
ao Espírito que passa a viver em outra dimensão da vida.
Segundo o
Espiritismo, a morte é “[...] uma simples mudança de estado, a
destruição de uma forma frágil que já não proporciona à vida as condições
necessárias ao seu funcionamento e à sua evolução. [...].1Ensina igualmente: a separação do Espírito
do corpo que lhe pertencia não é dolorosa, sobretudo quando
das mortes naturais, que decorre dos desgastes biológicos dos órgãos2, como também não é uma separação
brusca. A “alma se desprende gradualmente e não escapa como um pássaro
cativo a que se restituiu subitamente a liberdade.[...].”3 Assim,nunca é demais lembrar:
[...] A observação comprova que, no instante da morte, o desprendimento
do perispírito não se completa subitamente; que se opera gradualmente e com uma
lentidão muito variável conforme os indivíduos. Em uns é bastante rápido,
podendo dizer-se que o momento da morte é também o da libertação, que se
verifica logo após; em outros, sobretudo naqueles cuja vida foi toda
material e sensual, o desprendimento é muito menos rápido, durando algumas
vezes dias, semanas e até meses, o que não implica a existência, no corpo, da
menor vitalidade, nem a possibilidade de um retorno à vida. [...].De fato, é racional conceber-se que, quanto mais o Espírito
se tenha identificado com a matéria, tanto mais penoso lhe seja
separar-se dela, ao passo que a atividade intelectual e moral e a
elevação dos pensamentos operam um começo de desprendimento, mesmo a vida
durante o corpo.[...].4
A falência dos
órgãos e o desprendimento perispírito que se segue definem o estado de transição ou depassagem de um plano para outro. Neste momento, o
Espírito encontra-se inconsciente5, situação que
pode perdurar por um maior ou menor espaço de tempo, da acordo com as condições
pessoais de cada um.
A chegada no plano espiritual,
porém, pode ser sofrida ou não. Trata-se de um sofrimento moral. É a alma
que sofre, não o corpo, pois este transforma em matéria inerte, morta, em
processo de decomposição. O sofrimento poderá ser mais agravado se o
Espírito se manter jungido ao corpo em decomposição e à vida que se extinguiu.
Situações semelhantes são encontradas
em certos gêneros de suicídios, em homicídios; em desencarnantes presos a
profundos remorsos, ou, ainda, em Espíritos vinculados aos prazeres da vida
material, apegados excessivamente a bens e/ou pessoas. Nestas circunstâncias, a
morte é vista como uma perda irreparável, um sofrimento atroz, uma
sensação de destruição total, porque ele, o Espírito, desconhece a sua própria
imortalidade que existe e preexiste à morte do veículo somático.
Situação bem diversa acontece
com o Espírito que durante a existência se deixou conduzir por uma vida mais
simples, sem ganâncias ou ambições exageradas; que procurou desenvolver
virtudes, combatendo imperfeições; que praticou a caridade, promovendo o bem;
que cumpriu os seus deveres familiares, profissionais e sociais.
A sua desencarnação será mais
amena; os sofrimentos e as angústias do período de transição serão
passageiros e breves; a adaptação na nova moradia será tranquila,
sabendo administrar com serenidade a saudade dos entes queridos que permanecem
reencarnados, e as surpresas do além-túmulo.
Ajustado à vida no plano
espiritual, o Espírito colherá, então, os frutos, bons ou amargos,
do que semeou durante a experiência reencarnatória, se submetendo, no final das
contas, à lei de progresso. É o que nos lembra André Luiz quando aponta o
valor da desencarnação como lei divina:
Toda morte traz
dor.
Sem a
desencarnação, porém, não atingiríamos a renovação precisa, largando processos
menos felizes de vivência ou livrando-nos da caducidade no terreno das formas.
Compreendamos, em
face disso, que não podemos louvar as dificuldades que nos rodeiam, mas é
imperioso reconhecer que, sem elas, eternizaríamos paixões, enganos,
desequilíbrios e desacertos, motivo pelo qual será justo interpretá-las por
chaves libertadoras, que funcionam em nosso Espírito, a fim de que nosso
Espírito se mude para o que deve ser, mudando em si e fora de si tudo aquilo
que lhe compete mudar.6
Marta Antunes Moura, coordenadora das Comissões Regionais na área da
Mediunidade da Federação Espírita Brasileira (FEB), Vice-presidente da FEB.
Bibliografia
1.
DENIS, Léon. O Problema do Ser, do Destino e da Dor. 1. ed. Rio de
Janeiro:FEB, 2008. 1ª Parte (O Problema do Ser), cap. X (A morte), p.175.
2.
KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. céu e o inferno. Tradução
de Evandro Noleto Bezerra.4. ed. 1. Imp. Brasília: FEB: 2013. Questão
154-comentário, pág. 113.
3.
______. Questão 155-a, pág. 113.
4.
______. Questão 155-a-comentário,
p.114.